O Raj, diminutivo carinhoso de nome mais complexo, é um daqueles indianos moçambicanos gentis com luz interior, alma e cor dados pelo Índico, e basicamente desde muito cedo um dos amores do meu pai. Os outros amores dele são a minha mãe e os filhos.
Faz parte das nossas vidas desde que lembro, na nossa casa, à nossa mesa, nos negócios dos meus pais, nas férias, em tudo, tão natural que era mais um tio meu, com a Carlota, a minha irmã mais velha, a dizer-me que ele era o companheiro do meu pai, mas não percebia.
Acho que comecei a perceber quando fui desflorado pelo Bernardo, parece que me abriu o rabo e os olhos ao mesmo tempo, interessando-me por tantas outras coisas, o que me rodeava, os corpos, mamas, vaginas, pernas, pénis, cus, de mulheres homens e tudo o que conseguisse ver através de um buraco de uma fechadura ou escondido no interior de um armário.
A relação do meu pai com o Raj, ao vê-la pela primeira vez, foi como uma chapada, à noite recolhiam ao quarto deles, de dia estavam em casa ou no escritório, a minha mãe ali, nós ali, os empregados ali, uma confusão tremenda.
Perseguia-os como testemunha invisível, nos gestos e nas reacções, dentro e fora de casa, à espera ou à espreita, e à minha mãe também, nos meus pensamentos próprios, queria saber sem saber como perguntar, o que seria ou não normal, o que se vê pelos outros.
Mais de perto vi-os da primeira vez, a casa parecia abandonada, um estio de sol quente a tremer, irmão dum vapor húmido de fornalha, instalados nos quartos e corredores, cá fora cigarras ruidosas no jardim, ouvi-os a rir e a correr, ao Raj e ao meu pai, como meninos nus a brincar, a irem do quarto para o chuveiro.
Ninguém estava em casa, era o que eles pensavam, pequeno eu como era, escondia-me em qualquer lado, olheiro como um gato, em silêncio concertado, fui vê-los na fechadura, a banharem-se em abraços, beijos quentes e corpos bronzeados, os pénis deles em pé, colados um ao do outro, naquela tarde quente, como o do Bernardo e eu.
O meu pai virou-se para a parede, com o Raj encostado a ele, costas e peito juntos, como se fossem um só, alçou-lhe o rabo para fora, e penetrou-o no cu, lembrei-me logo do Bernardo, a pedir-me "vira-te, dá-me o rabinho", a fazer-me o mesmo que o Raj, com o mesmo querer meu, igual ao do meu pai.
Guardei isso para mim, para o dizer à minha mãe, do porquê que era assim, se ela sabia ou não, e encontrei-a depois, a ouvi-la pela sua boca "Leo, o teu pai é homossexual, gosta de pessoas do mesmo sexo, de homens, é um segredo nosso, um dia vais compreender".
Tinha o meu segredo com o Bernardo, que não contava a ninguém, "e mãe se calhar também sou assim, homossexual?", ela riu-se "não penses nisso, isto é do teu pai, nós adoramos o Raj, é o amor dele e nosso amigo", "e tu mãe?'", perguntava, "eu sou eu, não me importo e tenho-vos a vocês e eles".
Havia assim esse silêncio, de coisas que não eram para ser ditas, apenas aceites e compreendidas, num tempo perigoso e formatado, as relações eram como eram, por caminhos bem definidos, ai de alguém que se atrevesse, a ter escolhas ou diferenças, teria pena massacre e excomunhão, o amor se se quer é só um, sem lugar a desejo ou paixão.
Naquela outra tarde, íamos eu, o meu pai e o Raj, a caminho da casa de praia, de carro e em terra de santos, a minha mãe tinha-lhe dito "leva o Leo contigo", na estrada o meu pai conduzia, atrás vi-os a falar e a rir, tocavam-se nas mãos a brincar, caricias de um amor verdadeiro, como um que nunca tive.
A vê-los pensava, nas minhas ideias de miúdo, não sei como nem me interessa, deve ter havido um momento, em que a minha mãe soube, que o meu pai gostava de homens, cu, sexo e às vezes paixão, e que, por termos o que temos hoje, lá o acertaram eles, mandavam as convenções e os filhos, e, em se ser mais livre, por vontade da minha mãe.
Acho que comecei a perceber quando fui desflorado pelo Bernardo, parece que me abriu o rabo e os olhos ao mesmo tempo, interessando-me por tantas outras coisas, o que me rodeava, os corpos, mamas, vaginas, pernas, pénis, cus, de mulheres homens e tudo o que conseguisse ver através de um buraco de uma fechadura ou escondido no interior de um armário.
A relação do meu pai com o Raj, ao vê-la pela primeira vez, foi como uma chapada, à noite recolhiam ao quarto deles, de dia estavam em casa ou no escritório, a minha mãe ali, nós ali, os empregados ali, uma confusão tremenda.
Perseguia-os como testemunha invisível, nos gestos e nas reacções, dentro e fora de casa, à espera ou à espreita, e à minha mãe também, nos meus pensamentos próprios, queria saber sem saber como perguntar, o que seria ou não normal, o que se vê pelos outros.
Mais de perto vi-os da primeira vez, a casa parecia abandonada, um estio de sol quente a tremer, irmão dum vapor húmido de fornalha, instalados nos quartos e corredores, cá fora cigarras ruidosas no jardim, ouvi-os a rir e a correr, ao Raj e ao meu pai, como meninos nus a brincar, a irem do quarto para o chuveiro.
Ninguém estava em casa, era o que eles pensavam, pequeno eu como era, escondia-me em qualquer lado, olheiro como um gato, em silêncio concertado, fui vê-los na fechadura, a banharem-se em abraços, beijos quentes e corpos bronzeados, os pénis deles em pé, colados um ao do outro, naquela tarde quente, como o do Bernardo e eu.
O meu pai virou-se para a parede, com o Raj encostado a ele, costas e peito juntos, como se fossem um só, alçou-lhe o rabo para fora, e penetrou-o no cu, lembrei-me logo do Bernardo, a pedir-me "vira-te, dá-me o rabinho", a fazer-me o mesmo que o Raj, com o mesmo querer meu, igual ao do meu pai.
Guardei isso para mim, para o dizer à minha mãe, do porquê que era assim, se ela sabia ou não, e encontrei-a depois, a ouvi-la pela sua boca "Leo, o teu pai é homossexual, gosta de pessoas do mesmo sexo, de homens, é um segredo nosso, um dia vais compreender".
Tinha o meu segredo com o Bernardo, que não contava a ninguém, "e mãe se calhar também sou assim, homossexual?", ela riu-se "não penses nisso, isto é do teu pai, nós adoramos o Raj, é o amor dele e nosso amigo", "e tu mãe?'", perguntava, "eu sou eu, não me importo e tenho-vos a vocês e eles".
Havia assim esse silêncio, de coisas que não eram para ser ditas, apenas aceites e compreendidas, num tempo perigoso e formatado, as relações eram como eram, por caminhos bem definidos, ai de alguém que se atrevesse, a ter escolhas ou diferenças, teria pena massacre e excomunhão, o amor se se quer é só um, sem lugar a desejo ou paixão.
Naquela outra tarde, íamos eu, o meu pai e o Raj, a caminho da casa de praia, de carro e em terra de santos, a minha mãe tinha-lhe dito "leva o Leo contigo", na estrada o meu pai conduzia, atrás vi-os a falar e a rir, tocavam-se nas mãos a brincar, caricias de um amor verdadeiro, como um que nunca tive.
A vê-los pensava, nas minhas ideias de miúdo, não sei como nem me interessa, deve ter havido um momento, em que a minha mãe soube, que o meu pai gostava de homens, cu, sexo e às vezes paixão, e que, por termos o que temos hoje, lá o acertaram eles, mandavam as convenções e os filhos, e, em se ser mais livre, por vontade da minha mãe.
Talvez fossem as escapadelas do meu pai, muitas vezes na cidade a passar noites, os olhares para homens mais indiscretos dele, umas ligações perigosas aqui e acolá, que deram essa ideia confirmada à minha mãe, que ele tinha alguns casos, e que por ser ele quem é, sem se chocar ou deixar de compreender, só podiam ser homens.
Como o Raj chegou não sei, se já existia ou só depois ficou, vejo-os agora pela minha lente, são felizes se calhar para sempre, e onde cabiam todos, um amor apaixonado por definição.
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